Ruínas de São Miguel das Missões (Brasil) - Santo Tomé (Argentina)

Janeiro de 2009.
Um breve passeio para conhecermos um pouco da história do período colonial do Estado, em visita às ruínas da redução jesuítica-guarani, de São Miguel das Missões (RS) e na seqüência, estendermos nossa viagem à cidade argentina de Santo Tomé.
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Quinta-feira, 08/01/2009:

Às 7 da manhã, moto carregada, saí para me encontrar com o filho, que já estava me esperando com a moto dele pronta, ainda na garagem.
Não havia pressa.
Depois de algumas fotos, saímos lentamente pela rampa que dava acesso à rua, naquela ensolarada manhã de quinta-feira. 
Ainda não sentíamos o frio. Essa sensação veio aos poucos, até nos obrigar a uma parada para aquecermos as mãos, depois de termos rodado aproximadamente, 80 quilômetros, já em Passo Fundo.
Nos primeiros momentos de uma viagem apanhando frio, mesmo com luvas, as mãos são mais afetadas pelo vento do que o resto do corpo e não demora para que os dedos comecem a perder a sensibilidade e enregelar.
Mas o que percebemos, e esse é o ponto importante, é que, se fizermos uma pequena parada e aquecermos as mãos até recuperarmos os movimentos dos dedos, poderemos suportar muito mais tempo do que o transcorrido até a primeira parada. Isso já havíamos notado em outras viagens que fizemos.
Mãos aquecidas, aproveitamos para tirar umas fotos.
Eu não queria tirar o tripé que estava preso ao alforge, apoiado no baú traseiro e pedi a um passante para que tirasse uma foto da gente. Estranhamente ele se negou, alegando que não sabia tirar foto com máquina digital. Percebendo sua pouca vontade em colaborar, não insisti. Já estava desistindo, quando surgiu uma moça, vindo do outro lado da estrada, para quem fiz o mesmo pedido e novamente, frustrado, recebi a mesma resposta: não sabia tirar fotos e estava com pressa. Contrariado, sugeri ao Jacson seguirmos, sem tirarmos as fotos. Afinal, aquele lugar não tinha muito coisa de atraente mesmo...
Subimos nas motos e daí em diante, não pedimos para mais ninguém. Deixei a preguiça de lado e passei a montar o tripé, toda vez que decidíamos nos fotografar.
Havia ainda um longo trecho pela frente e a sensação de aventura não deixava lugar para aborrecimentos.
Passados os primeiros momentos de frio, e recuperados no rápido descanso, enfrentamos a estrada com ânimo renovado, parando apenas para um café e um sanduíche em Carazinho.
À medida que o dia avançava, o frio dava lugar a um calor confortável, produzido pelo Sol que se firmava, tendo ao fundo um Céu praticamente sem nuvens.
Não demorou muito para que decidíssemos tirar as roupas de lã que estavam embaixo das roupas de couro e, naturalmente, essa parada também foi um pretexto para mais fotos. Fotos com toques de efeitos especiais; idéia do Jacson desde a viagem a Lages (Moto Neve, julho de 2008) e que passou a fazer parte do nosso estilo de fotografar.







 



Como disse, não havia pressa.  
A parada seguinte foi no trevo de acesso a Santo Ângelo, para um bom almoço e mais fotos diante da Cruz Missioneira.



Fazia muito calor, mas as roupas de couro nos dão proteção, e isso não podíamos dispensar.
Seguimos pela BR-285, por mais 30 km em direção ao trevo de acesso à rodovia que nos conduz à cidade de São Miguel das Missões, onde estão localizadas as ruínas da principal redução jesuítica.
Chegando a esse entroncamento, se avista o belíssimo pórtico que assinala parte da vasta área que abrigou essas reduções no Século XVII. 








Sobre o pórtico, 16 quilômetros antes do sítio, pode-se ler o brado de Sepé-Tiaraju, índio guarani que organizou a resistência armada contra a invasão dos exércitos português e espanhol: “Co yvy oguereco yara” (Esta terra tem dono!).


Ao longo desse trecho pavimentado, várias paradas de ônibus em estilo característico e um local onde funciona um escritório de informações turísticas.




Chegada a São Miguel das Missões:

Chegamos à Pousada das Missões, sem termos feito reserva, onde nos hospedamos em quarto duplo, com café-da-manhã. É próxima ao sítio arqueológico (cerca de 200 metros). Ao lado dessa pousada, um lugar aconchegante para jantar, onde servem “a La Carte” a preço acessível.



Como chegamos cedo do dia (15h:30min), ainda foi possível visitarmos o parque arqueológico.
Há outros passeios, como visita à Fonte Missioneira; aos benzedores; à uma aldeia guarani; fazer trilha. Mas, devido ao pouco tempo, optamos apenas em conhecermos o sítio e assistirmos ao Espetáculo de Som e Luzes, que acontece ao anoitecer, todos os dias.
Descarregadas as motos e trocadas as roupas, iniciamos a visita.
No Museu das Missões (uma pequena construção, localizada dentro da área do sítio), quadros retratam parte da saga guarani, além de uma sala reservada a projeções, onde assistimos a um vídeo que durou cerca de 10 minutos, sobre o histórico dessas reduções. 





 





Em seguida, nos dirigimos às ruínas, considerada Patrimônio Histórico e Cultural da Humanidade.
Importante dizer que essas ruínas compõem o que restou de toda uma nação chamada de Os Sete Povos das Missões, sendo essas ruínas a mais importante, onde ainda se vê restos de fundações de várias construções, casa de padres e índios, oficinas, colégios e cemitérios.
A Igreja de São Miguel Arcanjo, cuja construção teve início em 1735 e concluída dez anos depois, ainda é suntuosa, mesmo agora, quando se admira o que restou dela.




Por aquelas majestosas portas, padres passaram em direção ao altar, colorido de imagens e castiçais.
Iniciamos o percurso entre as paredes desgastadas pelo tempo e pela própria história.

Parecia que não havia o que dizer; apenas contemplar.



Fiquei imaginando o recinto ressentindo a cheiro de velas e tomado de índios, naquelas manhãs de domingo, ou, à noite, quando o odor característico das lamparinas se espalhava por todo o átrio. Lamparinas que iluminavam todo o ambiente, mas que também projetavam sombras ao movimento produzido pelo vento. 
Índios que se apinhavam em silêncio, maravilhados diante de tanta pompa, onde o ar era preenchido pelo coro de dezenas de vozes de um coral do qual participavam também, seus filhos.



Deixando um pouco de lado essas divagações, continuei a passos lentos, a percorrer aquele espaço marcado de impressões.
Quanta vida se passou por ali, quanta atividade e, ao mesmo tempo, quanto sangue derramado. 



Percorríamos as ruínas sob um silêncio nostálgico. Apenas eram ouvidos sussurros de um ou de outro visitante. A sensação era de respeito. Respeito pelos que lá passaram; respeito pelas vidas que lá foram ceifadas. Era como se ninguém quisesse perturbar aquele encantamento, aquele clima de mistério.
Lá fora não era diferente.
O silêncio apenas era interrompido pelo barulho do vento batendo nas árvores, e das vozes abafadas de um pequeno grupo de crianças indígenas que ofereciam seu artesanato ao lado do Museu. E é alí, nessa construção contemporânea, onde estão expostas imagens de santos e santas entalhadas na madeira, com tanto esmero, por seus antepassados e pelos jesuítas. Os mesmos, talvez, que ajudaram na construção do complexo.




No final da tarde, o vento, acompanhado das nuvens que começavam a encobrir o Céu, prenunciava chuva.
Retornamos à pousada, de onde, depois da janta, conseguimos um guarda-chuva emprestado para assistirmos ao Espetáculo de Som e Luzes em frente à Catedral em ruínas, pois nos garantiram que haveria a projeção mesmo com chuva.
Saímos a pé, já com uma garoa fina nos acompanhando. Logo depois, essa garoa deu lugar a um vento frio, que varria todo o descampado.
O show teve início às 21:30.
Apesar do vento frio e da promessa de chuva iminente, várias pessoas estavam sentadas nas arquibancadas. As luzes artificiais do palco ao ar livre e o som que saía dos alto-falantes, se alternavam com os trovões e os relâmpagos que riscavam a escuridão, produzindo um clima fantasmagórico e sinistro à narração da epopéia guarani. Eu já havia assistido a esse show em outras visitas, mas não se comparou aos efeitos que esse causou.
Findo o Espetáculo, que durou cerca de uma hora, nos recolhemos à pousada.
Havia parado de chover, mas as nuvens continuavam nos preocupando, pois mais um trecho da viagem nos aguardava. O próximo destino era Santo Tomé, na Argentina, onde pretendíamos almoçar e, logo depois, iniciarmos o retorno, o que totalizaria, nesse dia, 627 quilômetros.

Em direção a Santo Tomé(AR):

O dia seguinte, sexta-feira, amanheceu bastante nublado, mas sem chuva.
Tomamos o café-da-manhã, cheio a dúvidas: se deveríamos continuar a viagem até o final ou se deveríamos retornar para casa.
O Jacson sugeriu continuarmos, considerando que tínhamos apenas 140 quilômetros até a Argentina e que mesmo que chovesse, deveríamos dar continuidade ao plano e irmos em frente, pois não teria sentido vir até aqui (São Miguel das Missões) e retornar correndo para casa. Concordei, pois, se fizéssemos isso, sem dúvida, ficaria um enorme sentimento de frustração. Afinal, viajar de moto é sempre uma aventura...
Carregamos as motos. E após o abastecimento, seguimos viagem.
À medida que avançávamos, acompanhados de uma brisa, as nuvens escuras foram se afastando, deixando o Céu mais limpo e, em alguns momentos, quase não eram  avistadas. Sol e calor retornaram com força.




Chegamos a São Borja, cidade brasileira na fronteira com a Argentina, quase ao meio-dia.
Atravessamos a ponte internacional e estacionamos na Aduana para ingresso na Argentina.









Foi aí que começou nossa decepção (felizmente, a única da viagem).
Eu havia esquecido minha carteira de identidade e não tínhamos a Carta-Verde.
Quanto à carteira de identidade, foram condescendentes, aceitaram apenas minha Carteira de Habilitação com foto e expediram um “passe livre”, sem assinatura e sem indicações precisas, feitas no verso de um pedaço de papel rascunho. 


Mas quanto ao Seguro Obrigatório, foram irredutíveis. Nem eles sabiam que a própria seguradora, indicada por eles e para onde nos dirigimos para fazer esse seguro (cujo escritório está localizado dentro da área da Aduana Argentina), não faz esse tipo de seguro para motocicletas. Eu sabia que precisávamos dessa Carta-Verde, mas considerando que apenas iríamos almoçar do outro lado e retornaríamos, imaginei que o bom senso dos argentinos prevaleceria. Isso já havia acontecido nas outras duas ocasiões. Mas isso não se repetiu e lamentamos não termos contatado com uma seguradora antes de viajarmos.
Mas, já que estávamos lá, voltarmos a São Borja para almoçar, seria a coroação de nossa derrota. Atravessamos a pista e fomos fazer o câmbio. E foi assim, sob o Sol escaldante de janeiro que deixamos as motos carregadas na Alfândega, pegamos um táxi (ao custo de cerca de R$ 7,00 para ir e outro tanto para voltar) e fomos almoçar no Cassino em Santo Tomé.





     





É um bom lugar para almoçar. Servem “a La Carte” e por um preço acessível. Aceitam pesos ou reais.

Assim que terminamos de almoçar, um passeio pelas mesas e máquinas, quase vazias àquela hora da tarde (14horas). O Jacson resolveu arriscar uma aposta em uma das máquinas. E ganhou! $ 0,60 (sessenta centavos de peso). Optou por não reclamar o prêmio (questão social...)
Marcado pela curiosidade, o garçom perguntou se estávamos com as motos, ao que respondemos que não. Mas não se surpreendeu quando dissemos que nos exigiram o Seguro Obrigatório. Segundo ele, a legislação havia mudado, inclusive sobre a obrigatoriedade do uso de capacete no perímetro urbano. Observamos, realmente, que alguns motociclistas transitavam usando capacetes, embora simples, que pouco ou quase nada ofereciam em termos de segurança.
 Não serviu de consolo, mas acabamos aceitando a idéia da rigidez da legislação argentina, lembrando do Encontro de Motos em Apostoles (AR), em 2008 (que infelizmente, não fomos) em que o tema foi o uso do capacete.

Retorno para casa:

Após o garçom chamar um táxi, voltamos à Aduana, pegamos as motos, abastecemos em São Borja e iniciamos o retorno.
O restante da viagem de volta, transcorreu sem contratempos, apesar de pegarmos chuva intensa de Santo Ângelo a Passo Fundo, nos obrigando a diminuir o ritmo da viagem e a exercitarmos continuamente a paciência.




Nas lembranças de cada um, lugares visitados, momentos compartilhados e, a sensação de que estávamos sós, na vastidão desse espaço, procurando freneticamente alcançar o horizonte.
Sonhos e planos ficaram espalhados ao longo dessa estrada. Apenas o barulho do vento e a liberdade nos faziam companhia.
Ainda dividiremos outras aventuras. Somos companheiros de mesma jornada em uma viagem sem fim...

 


RUÍNAS DE SÃO MIGUEL DAS MISSÕES
HORÁRIOS:

Visitação ao parque arqueológico:
Das 09hrs às 12hrs e das 14hrs às 18 hrs, de terça-feira a domingo.
Horário de verão: das 09hrs às 12hrs e das 14hrs às 20hrs.
Preço: R$ 5,00

Espetáculo de Som e Luzes:
Ao anoitecer, inclusive nas segundas-feiras, a partir das 19hrs.
Horário de verão: a partir das 21:30hrs.
Preço: R$ 5,00


SANTO TOMÉ-AR:
- Almoço no Cassino em Santo Tomé, na Argentina (a La carte): R$ 12,00 por pessoa.
- Cotação do peso argentino (09/09/2009): R$ 0,70.

DISTÂNCIAS:
Erechim(RS) a São Miguel das Missões (Erechim-Passo Fundo-Ijui-Sânto Ângelo-São Miguel das Missões): 347 km
São Miguel das Missões a Santo Tomé (AR), passando por São Borja: 140km
Distância total percorrida (ida e volta): 974km

SITES VISITADOS:

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